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Pegasus: vazamento de dados de spyware israelense revela mais de 50 mil vítimas de governos autoritários

Guilherme Petry

Políticos, ativistas, jornalistas e advogados do mundo todo estão sendo monitorados por um spyware iraniano chamado Pegasus, vendido para representantes políticos de países autoritários. Uma série de reportagens apurada por mais de 80 jornalistas de 17 grupos de mídia diferentes, publicada pela Forbidden Stories, revelou um vazamento massivo de mais de 50 mil números de telefones de pessoas infectadas pelo Pegasus, que estão e sendo monitoradas por governos autoritários ao redor do mundo.

Não foi publicado como esses dados foram encontrados pelo grupo de jornalistas. O vazamento foi descrito apenas como "sem procedentes". O The Pegasus Project é uma série de reportagens investigativas, produzida pela parceria dos 17 veículos de mídia com a Amnesty International (Anistia Internacional) uma ONG de direitos humanos com sede em Londres, que ajudou a reportagem com auxílio técnico e testes forenses em smartphones infectados. Os conteúdos estão sendo publicados pela Forbidden Stories, um grupo de imprensa sem fins lucrativos, com sede na França.

"Um vazamento sem precedentes de mais de 50.000 números de telefone selecionados para vigilância pelos clientes da empresa israelense NSO Group mostra como essa tecnologia tem sido sistematicamente abusada por anos. O consórcio Forbidden Stories e a Anistia Internacional tiveram acesso a registros de números de telefone selecionados por clientes da NSO em mais de 50 países desde 2016", escreve a primeira publicação da série The Pegasus Project.

O Pegaus é um software de espionagem, vigilância e "investigação forense", desenvolvido e comercializado pelo Grupo NSO, uma desenvolvedora de soluções de inteligência e segurança da informação, fundada em 2010, em Tel Aviv, Israel. O aplicativo é capaz de coletar uma infinidade de dados como fotos, vídeos e mensagens armazenadas no dispositivo, assim como faz transmissão em tempo real do histórico de navegação, localização, microfone e câmera.

Conforme explica Agnès Callamard, secretária-geral da Amnesty International, o Pegasus infecta smartphones Android e iPhone e está sendo utilizado por governos autoritários para encontrar e silenciar jornalista e ativistas de direitos humanos de diversos países.

"O Pegasus Project mostra como o spyware da NSO é a arma preferida de governos repressivos que buscam silenciar jornalistas, atacar ativistas e esmagar dissidentes, colocando inúmeras vidas em perigo. Essas alegações acabam com qualquer alegação da NSO de que tais ataques são raros [...] Embora a empresa alega que seu spyware é usado apenas para investigações criminais e terroristas legítimas, está claro que sua tecnologia facilita o abuso sistêmico. Eles pintam um quadro de legitimidade, enquanto lucram com as violações generalizadas dos direitos humanos", explica Callamard.

David Peg e Stephanie Kirchgaessner, ambos repórteres investigativos do The Guardian, um dos 17 veículos de imprensa que estão colaborando com a investigação, explicam que o Pegasus é capaz de furtar praticamente todos os dados gerados por um smartphone. Entenda como funciona no vídeo:

As vítimas

Através do The Pegasus Project, o The Guardian teve acesso à registros de milhões de casos de vítimas de campanhas de espionagem com Pegasus. As vítimas se dividem principalmente entre os países Hungria, Azerbaijão, Cazaquistão, Ruanda, Bahrein, México, Índia, Marrocos, Dubai, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita. Mas há também outros países, que se dizem democráticos, envolvidos na espionagem de seus civis.

Mapa de alguns dos países com governos autoritários que mais utilizam o Pegasus contra sua própria população, segundo o vazamento. Foto: Forbidden Stories.
Mapa de alguns dos países com governos autoritários que mais utilizam o Pegasus contra sua própria população, segundo o vazamento. Foto: Forbidden Stories.

Ao analisar o vazamento, foram encontrados os contatos dos jornalistas Carmen Aristegui, Bradley Hope, Khadija Ismayilova, Roula Khalaf, Cecilio Pineda, Omar Radi, Paranjoy Guha Thakurta, Siddharth Varadarajan, Szablocs Panyl, Andras Szabo e dos ativistas Loujain Al-Hathloul, Hany Babu, Joseph Breham, Umar Khalid, Eduardo Mac-Gregor, Samed Rahimli, Shoma Sen, Alejandro Solalinde e Rona Wilson.

Além dos ativistas e jornalistas listados, foram encontrados membros da família de Jamal Khashoggi, um jornalista da Arábia Saudita, assassinado pela família real de seu país, em outubro de 2018, por fazer críticas ao governo no canal de televisão, Al-Arab News, onde era editor.

Yasin Aktay, Yahya Assiri, Hatice Cengiz, Hanan El-Atr, Abdullah Khashoggi, Madawi Al Rasheed e Azzam Tamimi, são familiares e amigos de Jamal, que também tiveram seus smartphones vigiados pelo governo da Arábia Saudita, antes e depois da morte de Jamal.

Grupo NSO se defende e ameaça processo jurídico

No mesmo dia da publicação do The Pegasus Project, o NSO Group se manifestou através de um comunicado publicado no seu próprio site, onde negam as acusações de que seu software Pegasus é utilizado para vigilância de civis e pessoas não envolvidas em crimes. Além disso, disse que a reportagem da Forbidden Stories foi construída com informações falsas, de fontes não identificadas e sem base factual. O grupo disse ainda considerar um processo judicial por difamação.

"O relatório da Forbidden Stories está cheio de suposições erradas e teorias não corroboradas que levantam sérias dúvidas sobre a confiabilidade e os interesses das fontes. Parece que as 'fontes não identificadas' forneceram informações que não têm base factual e estão longe da realidade [...] Depois de verificar suas alegações, negamos firmemente as falsas alegações feitas em seu relatório. Suas fontes forneceram-lhes informações que não têm base factual, como fica evidente pela falta de documentação de apoio para muitas de suas reivindicações. Na verdade, essas alegações são tão ultrajantes e distantes da realidade, que a NSO está considerando um processo de difamação", escreve um porta-voz do NSO Group.

A série de reportagens do The Pegasus Project é um projeto em andamento e a The Hack vai continuar cobrindo o caso.


Fontes: Amnesty International; The Pegasus Project; The Guardian, NSO Group.

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